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Quem sou eu

Eu nasci pedra e vim virar água.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Oiá

Oya kooro nilé ó geere-geere
Oya kooro nlá ó gè àrá gè àrá
Obìrim sópa kooro nilé geere-geere
Oya kiì mò rè lo

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

hoje acordei com este poema na cabeça

Lição

Tarde, a vida me ensina
esta lição discreta:
a ode criatalina
é a que se faz sem poeta.

Carlos Drummond de Andrade

A cena cristalina se faz sem ator. Que delícia!

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

busca pessoal

"Seja fiel a si mesmo"
Peer Gynt, de Ibsen

terça-feira, 7 de setembro de 2010

MARTINA, UM CONTO CURTO

Para Tom

Janeiro de 2008

Perguntei a Martina, o que tem atrás dessa ventania? Ela me olha, me olha e me olha muito. Não responde. Esqueço isso porque Martina aperta minha mão contra o seu peito, inclina sua cabeça para trás e tira com as minhas duas mãos alguns fios de cabelo do seu rosto. Eu gosto da sua mão no meu peito, me dá vontade de me espalhar em você, esse tipo de coisa que Martina faz. Então, ainda com a cabeça inclinada me oferece sua boca.

Beija. Me beija ela diz, com j sibilante e i redondo, bem articulado. Hálito de planta; incompreensível. Ela se espalha na minha boca e a ventania dos seus olhos me confunde, me esquece me reconhece. Martina passeia por mim sem perguntar nada.

Moço bonito. Meu coração transborda da alça do vestido.

Acordei assustado. O barulho eterno do mar indo e vindo me dava pânico. Eu não estava acostumado com isso, com essa insistência, essa brisa, essa água toda em volta, no ar. Nasci pedra, vim virar água tinha me dito Martina, essa louca!

Estava escuro aguado, tudo quieto e suando saí da cama, andei até a beira do mar, fiquei em pé esperando uma brisa daquele ar pesado. Eu tinha nascido pedra e a água me apavorava.

Havia encontrado Martina entre muitas pessoas falantes. No meio de todas aqueles tons as histórias acabavam antes de começar e eu ria sozinho porque me sentia excitado com aquela masturbação coletiva de vozes, com aquele tesão comprimido em repetições estridentes, quase histéricos e gargalhadas joviais que vinham do fundo da fantasia daquela gente um pouco embriagada. Eu estava perturbado com aquilo tudo, aquele mundo disfarçando, comigo mesmo ali; eu ria comigo mesmo e não entendia por que não cruzava a ponte para o outro porto, o outro lado. Não, eu ficava, estava fadado àquela convenção, àquele grito, àquilo que de longe incessantemente chamava. O vento ia longe mesmo quando eu tentava encontrar um outro sentido. A imagem do vente batendo em mim, entre mim e o que eu queria que fosse embora, ficava. Encravado no meu sangue acelerado. E entre o que era aquele simulacro, e o que nunca vinha, dançavam as vozes carregadas de pessoas desesperadas se consumindo. Era tudo imaginação, meu vício, minha maldição de Sísifo que eu mesmo havia passado anos construindo e lapidando e que a cada estouro de champanha, se desmoronava na velocidade da luz. Precisava do ar do porto do norte. Na minha cabeça coisas aconteciam separadamente da carne, da ação, e faziam dos meus passos nessa multidão desengonçada as minhas virgulas, os meus vacilos, minha arrogância. Dava mais um fundo gole no copo que eu segurava e tragava o ar de musgo que entrava duro nos meus pulmões. Quase sempre esse vento imaginado me fazia sentir mais falta do vento perdido em lugares no fundo insuportavelmente familiares e eu não atinava a idéia de atracar no mesmo porto tantas e repetidas vezes. Eu era detestável, e gozava sozinho pelas rodas que passava. Eu era desprezível.

Encontrei Martina quieta, um pouco curvada tirando palitos de fósforos queimados de uma caixa molhada. Tão concentrada. Sentei perto dela. Ela me olhou detalhadamente, desenhou meu auto-retrato, a maré subiu, ela me disse. Continuei olhando suas mãos desajeitadas, lindas! Sem esmalte. Um a um, cuidadosamente Martina tirava da caixa, fósforo por fósforo. O mesmo silêncio de depois estava ali. Martina era quieta do começo ao fim. Não era heroína cocota, não era mistério heróico, não era heroína! Nem era uma imagem que eu consumia depois cuspia. Não era heroína! Era quieta, do começo ao fim. Tive um impulso de sair, abandonar aquele corpo inclassificável, mas fiquei. Era uma dúvida. Uma dúvida autêntica. Nunca tinha tocado Martina. Nunca tinha tocado mulher nenhuma. Martina fumava. Ofereceu-me um cigarro, riscou um fósforo. Aceito. Aceito seu cigarro. Tem uma guerra acontecendo, tão absurda. Imediatamente percebi o absurdo das minhas palavras, saídas de dentro do nada. Não liguei. Fora de mim estava o próximo passo, fora de mim havia a peça onde todos os personagens falavam a mesma fala, choravam as mesmas lágrimas, desejavam os mesmos desejos e pela manhã, lamentavam os mesmos lamentos.

Martina, Martina, Martina, o que tem nesse ar?

Ali parado chega a brisa. Me oferece um cigarro, fumamos juntos. Martina me olha muito e eu olho de volta. A boca de Martina fumava e a ponta dos dedos desengonçados de Martina tocava de leve os seus lábios finos. Martina exalava seu cheiro em silêncio, por algum vão entre nós, alguma rachadura invisível, onde as palavras nem ralam. Meu corpo estava dilatado, e o ar ficou denso, não tinha mais vozes, gritos, portos ou champanhas histéricas transbordando suas mentiras. Com um pouco de esforço deixava o ar entrar e sair de mim. Tentava sugar a cheiro de Martina para dentro de mim mas ele chegava quando eu não estava esperando e me deixava um pouco nervoso, um pouco impaciente um pouco assustado. Entrava e saia de mim, aromas, ondas, sons estranhos de pássaros selvagens. Entravam, desciam pela minha garganta passavam pela boca do meu estomago e chegavam no meu pau. Queria matar Martina, devorar Martina viva. Eu sentia raiva de Martina, sentia Martina, sentia o que Martina fazia e amava Martina, sem sentido, sem rodeios nem virgulas. Quis sentir Martina por dentro. Segurei minhas mãos. Martina abre um pouco as suas pernas, inclina seu corpo na minha direção e chega a um centímetro do meu ouvido meu coração está batendo embaixo do meu umbigo.

Martina pegou minha mão. Uma depois a outra.

Martina sabia por onde eu queria andar com as minhas mãos, com a minha língua com o meu pau, ela sabia e não tinha medo. Martina parecia um bicho, uma fêmea sem medo do pecado embutido nos encontros, nas vidas, no sexo. Ela só segurava a minha mão suada e me olhava. Eu fiquei apavorado com a audácia daquela mulher. Inteira. Eu nunca tinha conhecido uma mulher inteira. Nunca mulher nenhuma tinha segurado minha mão tão perto de mim mesmo.Tudo parecia estar começando de novo. Eu estava nascendo de um longo sonho, eu não era mais o homem que achava que era, eu não tinha mais nome, endereço nem história. Eu era um menino que olha no buraco da fechadura pela primeira vez uma mulher. Eu não era mais a minha culpa nem as minhas idéias nem os meus desejos comprados. Eu era aquele estado. Martina botou minha mão por baixo do seu vestido em volta da sua cintura. Apertou minha mão contra o seu quadril e me puxou para mais perto dela. Ela tocou o meu rosto, meu cabelo, minha boca.

Martina era uma moça bonita, mexida, cheia de vento nos olhos. Tinha mãos quentes. Mãos e lábios quentes. Quente e leve. Quente e receptiva. Eu beijava os lábios quentes de Martina e olhava os olhos aerados de Martina, o beijo quente e fresco de Martina. Minhas mãos passeavam pelo corpo atento de Martina, com olhos de vento e lábios de fogo.

Nunca mais vi Martina.

Preliminar

Enquanto isso na terra de Alice as coisas continuam agitadas.
Spells
Começando a nova empreitada virtual!